Ao Vivo TMC
Ao Vivo TMC
Jamil Chade
Jamil Chade
Um dos grandes nomes do jornalismo internacional, Jamil Chade é jornalista e escritor, com vasta experiência em coberturas globais. Trabalhou para grandes veículos brasileiros e internacionais, sendo reconhecido por sua atuação como correspondente. Jamil Chade repercute os fatos que movimentam a geopolítica internacional. Entre os destaques da cobertura, as discussões na Organização das Nações Unidas, entidade que o jornalismo acompanha de perto.

Nova York desafia Trump: vitória de imigrante muçulmano marca reviravolta política nos EUA

Afinal, se há uma cidade capaz de mostrar a uma nação perdoada por Donald Trump como derrotá-lo, essa cidade é Nova York — o mesmo lugar que o viu nascer e crescer. A vitória do novo prefeito da cidade foi interpretada como uma derrota direta ao ex-presidente americano.

Esse foi o tom do primeiro discurso do novo líder nova-iorquino após o resultado das eleições. Em cerca de meia hora, ele destacou que sua vitória simboliza a superação da era Trump e que seu governo será o oposto do que o ex-presidente representa.

Durante o pronunciamento, o prefeito fez diversas referências à imigração e elogiou o papel dos imigrantes na construção da identidade de Nova York. Ele lembrou que a cidade é formada por imigrantes e agora é comandada por um deles. Também abordou os problemas sociais do município e, de maneira provocativa, dirigiu-se diretamente a Donald Trump: “Eu sei que você está me escutando, então aumente o volume”. A fala foi interpretada como um desafio público.

Trump respondeu nas redes sociais, de forma breve, afirmando: “Então que comece”, em referência ao embate político que se desenha entre os dois. Apesar da provocação, vale lembrar que o novo prefeito, Zohran Mamdani, não pode concorrer à Presidência dos Estados Unidos por não ter nascido no país. A Constituição americana exige que o presidente seja cidadão nato, o que o exclui de qualquer disputa nacional.

A vitória de Mamdani foi simbólica. O resultado ocorre exatamente um ano após a eleição de Donald Trump para um novo mandato presidencial, em uma data que marca tanto um alerta para os republicanos quanto uma tentativa de reorganização dos democratas. O partido ainda busca redefinir sua identidade política após a derrota nas eleições nacionais anteriores.

Na mesma noite, Trump enfrentou uma série de derrotas eleitorais em diferentes estados. De acordo com o jornal The Guardian, o ex-presidente sofreu uma “surra” política. O New York Times destacou que os resultados representaram o início de uma reação mais ampla contra Trump. Ele perdeu disputas na Virgínia, em Nova Jersey, no Maine e na Califórnia.

Em vários desses estados, os eleitores latinos desempenharam um papel decisivo. Em Nova Jersey, por exemplo, os descendentes de latino-americanos — que nas eleições anteriores haviam votado majoritariamente em Trump — agora se voltaram contra ele. Analistas apontam que muitos perceberam que a política de deportação, antes vista como restrita a criminosos, afeta também cidadãos comuns.

A ascensão de Mamdani reflete um momento particular da política americana. Nova York, uma cidade multicultural e com perfil distinto do restante do país, não representa um espelho fiel dos Estados Unidos, mas funciona como um símbolo de resistência política ao trumpismo.

Mamdani, descendente de indianos, nasceu em Uganda e é muçulmano. É casado com uma artista síria, filho de uma cineasta indiana e de um acadêmico. Sua trajetória pessoal contrasta fortemente com a de Donald Trump. Ele foi eleito prometendo uma agenda voltada à justiça social, ao congelamento dos aluguéis e à taxação dos super-ricos.

Críticos, porém, apontam que algumas de suas propostas são de difícil execução. A ideia de taxar os ultra-ricos de Nova York, por exemplo, enfrenta limitações legais, já que mudanças tributárias amplas dependem de aprovação em nível nacional. Mesmo assim, parte das políticas locais — como o sistema metropolitano de transporte — estão sob sua responsabilidade e podem ser reformuladas durante seu mandato.

Enquanto isso, os democratas tentam evitar generalizações sobre o significado da eleição nova-iorquina. O partido reconhece que a cidade é uma exceção no panorama político americano, mas vê na vitória de Mamdani um impulso simbólico em um momento de desgaste de Donald Trump.

Outro tema em destaque foi a polêmica sobre o redesenho dos distritos eleitorais na Califórnia. A prática, conhecida como gerrymandering, reformula os mapas de votação para favorecer determinados grupos políticos. Nesse caso, as mudanças ampliaram a representação democrata em áreas de maioria progressista. A população local aprovou o novo formato, enquanto no Texas os republicanos adotaram estratégia semelhante para garantir mais cadeiras.

Essas alterações territoriais, descritas por analistas como uma “pedalada” política, reforçam a disputa acirrada entre republicanos e democratas. O redesenho dos distritos se tornou uma ferramenta central nas batalhas eleitorais dos Estados Unidos.

O cenário político americano segue polarizado, mas a vitória de Mamdani em Nova York mostra uma possível virada simbólica. A cidade que viu Trump nascer agora se apresenta como o principal palco de oposição a ele — uma ironia política que o próprio ex-presidente reconheceu ao dizer, em suas redes, que “a disputa apenas começou”.